quinta-feira, 18 de novembro de 2010
Ecos da revolução francesa
A economia francesa era uma das mais fortes no fim do século 18. No comércio exterior, a França movimentava cifras equivalentes a 1 bilhão de libras, ficando atrás apenas da Inglaterra e da Espanha. Internamente, contudo, o país sofria de graves problemas. Para começar, os 97% da população que formavam o Terceiro Estado (camponeses, pequenos proprietários de terras, servos, artesãos e burguesia) arcavam com toda a carga tributária que sustentava o Primeiro Estado (clero) e o Segundo Estado (nobreza). Para complicar, o comércio e a indústria levaram à estagnação dos negócios: empresas fecharam, aumentando o desemprego. Clima de ebulição social.
Havia ainda a crescente disseminação dos ideais iluministas. Isso exigia, entre outras coisas, a divisão do poder em três esferas independentes e autônomas (Executivo, Legislativo e Judiciário). O cenário não poderia ser mais propício ao surgimento de insurreições populares. O rei Luís XVI, na tentativa de controlar a insatisfação dos súditos, decidiu convocar os Estados Gerais - uma assembléia de cidadãos que não se reunia desde 1614. "Para o monarca, isso definiria os meios necessários para superar a crise financeira do país", explica Modesto Florenzano, professor do departamento de história moderna da Universidade de São Paulo. Apesar do entusiasmo, a convocação foi um desastre. "A falta de acordo entre a maioria burguesa e a nobreza levou os líderes do Terceiro Estado a proclamar a Assembléia Nacional, que então aboliu os privilégios da aristocracia e do clero franceses", conta Florenzano. Inconformado, o rei interditou a sala e anulou todas as decisões. Parecia o fim da linha para os reformistas, não fosse a veemência do deputado Honoré Gabriel Victor Riqueti, o conde de Mirabeau, que apelou à guarda real: "Ide dizer aos que vos enviaram que só sairemos daqui por força das baionetas!" O resultado foi a substituição da Assembléia Nacional pela Assembléia Constituinte. O poder político passava agora das mãos do rei para os representantes do povo. Começava a revolução.
FIM DE UMA ERA
O resultado talvez fosse diferente se Luís XVI não tivesse voltado à carga. Em 11 de julho de 1789, ele demitiu o ministro das finanças, Jacques Necker, um dos mais favoráveis à reforma. Também mandou o exército a Paris e Versa-lhes para intimidar os revoltosos. Inflamados, em questão de horas, artesãos, jornaleiros, operários e comerciantes se armaram de punhais, pistolas, machados e pedras e se precipitaram pelas ruas. As tropas reais recuaram e, no dia 14 de julho, uma multidão tomou a Bastilha - a fortaleza-prisão símbolo do absolutismo francês. Autoridades foram destituídas. "A assembléia elaborou, então, um dos primeiros documentos sobre os direitos humanos no mundo: a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão", afirma Edgar De Decca, professor de história e filosofia da Universidade de Campinas. "A frase ·Liberdade, Igualdade e Fraternidade·, desse documento, soou como um trovão em todos os cantos da Europa."
Dois anos depois, tudo voltou a sair de controle. Em setembro de 1791, a Assembléia Nacional deu lugar à Assembléia Legislativa, constituída, em sua maioria, por um grupo de moderados (girondinos) e, em menor número, por políticos da ala conservadora e da republicana (jacobinos). Sem considerar o clamor da população por trabalho e comida, os girondinos forçaram a França a entrar em guerra contra a Áustria e a Prússia. "Acreditavam que uma vitória consolidaria os ideais da revolução", afirma De Decca. Mas para os líderes jacobinos Maximilien Robespierre, Georges-Jacques Danton e Jean-Paul Marat, o conflito servia para desviar a atenção das questões sociais. Os combates terminaram em fiasco, e o exército francês capitulou. "Em novembro de 1792, foram descobertos documentos que ligavam o rei aos inimigos, o que justificou as derrotas das campanhas militares. Luís XVI foi guilhotinado e, em agosto de 1792, foi eleita a Convenção Nacional", informa o professor da Unicamp. "Sob o comando de Robespierre, milhares de opositores do governo foram assassinados. O exército voltou a expulsar as tropas inimigas e o reino de terror foi instaurado. Um regime brutal tornou a ditadura jacobina impopular. Em 1794, os deputados da Convenção se rebelaram contra Robespierre, condenando-o à morte."
NASCE O MITO
Um ano depois, a Convenção Nacional elaborou uma nova constituição republicana. Nascia o Diretório, um parlamento bicameral composto de senadores e deputados. Nessa época, Napoleão Bonaparte, favorável aos jacobinos, já era general graças à brilhante defesa da cidade francesa de Toulon contra a invasão dos ingleses em 1793. Em 1796, foi enviado para comandar uma invasão à Itália. Mesmo com um exército de soldados despreparados, a operação foi um sucesso, outra vez por causa do gênio estratégico de Bonaparte. O general não só venceu como também garantiu a extensão das fronteiras da França até o Reno e os Países Baixos. Em 15 dias, os franceses fizeram 15 mil prisioneiros e mataram 10 mil homens.
A vitória assustou o Diretório, que, com medo da popularidade do general, instigou-o a realizar uma nova campanha, no Egito. "A intenção era manter Napoleão longe do jogo político", diz De Decca. "Mas as notícias que chegavam sobre o descontentamento dos franceses com o Diretório fizeram com que ele retornasse para dar um golpe de estado, o de 18 Brumário." Já como cônsul, Bonaparte procurou o reconhecimento de seu governo, estabelecendo a paz temporária entre a França e a Áustria. Organizou as finanças do país, criando o Banco Francês, e deu continuidade à reforma educacional iniciada pelo Diretório. Instituiu ainda a carreira diplomática, a burocracia estatal e promulgou o primeiro código civil da história. O general francês também se mostrava um grande estadista. Em breve, mostraria seu poder ao mundo
site:http://historia.abril.com.br/politica/ecos-revolucao-francesa-434482.shtml
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