terça-feira, 30 de novembro de 2010

A fúria Viking


No fim do século 8, a ilha de Lindisfarne, na costa nordeste da Inglaterra, abrigava agricultores, pastores e religiosos. Era um local sagrado, onde Santo Aidan havia vivido 100 anos antes. Todos os tesouros do povoado se resumiam a um punhado de objetos de culto, como cálices e hostiários feitos de metais preciosos, que ficavam guardados num mosteiro. Como a maioria da Europa era cristã, os moradores de Lindisfarne podiam até temer uma invasão, mas tinham certeza de que suas relíquias religiosas jamais seriam tocadas. Toda essa confiança ruiu em 8 de junho de 793. Foi quando uma horda de homens desembarcou na ilha, vinda das gélidas ter­ras do norte. Com ferocidade e rapidez, eles saquearam o mosteiro e mataram os monges que cuidavam dele.

A invasão de Lindisfarne foi só o começo. Ela marcou o início da Era dos Vikings. Entre o fim do século 8 e a metade do século 11, boa parte da Europa seria aterrorizada pelos guerreiros escandinavos. Primeiro na costa britânica, depois no resto do continente, os europeus descobriram que nada era páreo para os vikings. Nem crenças celestes nem tampouco regras terrenas. Não foi à toa que seu nome se originou do termo nórdico vik, que se refere a alguém que espreita em uma baía – em outras palavras, um pirata. Pagãos, os vikings não diferenciavam camponeses de monges ou tesouros de relíquias cristãs. Para eles era tudo igual, o que chocou os cronistas europeus da época, que descreviam os vikings como “bárbaros” sem piedade.


Gêngis Khan: A Fúria Mongol


O ano é 1215. Zhongdu, capital do Império Jin, cai na segunda tentativa de invasão pelos mongóis. Um ano antes, um pesado tributo foi pago e os bárbaros das estepes se foram. Desta vez, porém, nem os muros de pedra com 12 metros de altura, nem a chuva de setas despejada pelos mais de mil arqueiros postados no alto das torres foi capaz de deter o cerco. Quem não fugiu se arrependeu. A cidade foi saqueada e destruída. Seus habitantes foram mortos ou escravizados. Zhongdu, mais tarde rebatizada como Pequim, foi mais uma vítima da máquina de guerra comandada por Gêngis Khan.

Em seus 72 anos de vida, o líder mongol amealhou o maior império em extensão que um único homem já conquistou, da costa do Oceano Pacífico ao Mar Cáspio. Seus descendentes chegaram à Europa e ao Golfo Pérsico. “É a carreira militar mais fulminante da história. É como se um chefe de uma tribo indígena brasileira conquistasse hoje a América do Sul”, afirma Mario Bruno Sproviero, professor de Língua, Literatura e Cultura Chinesas da Universidade de São Paulo. A comparação faz todo sentido. Além de dispersos geograficamente, os mongóis não possuíam leis escritas, na verdade não tinham sequer escrita. Não conheciam a agricultura e seus modos eram pouco civilizados mesmo para os padrões da época.


segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Cleópatra, a alegria dos homens


Cleópatra Thea Filopator nasceu em Alexandria entre dezembro de 70 a.C. e janeiro de 69 a.C. Era filha de Ptolomeu XII e de mãe desconhecida. Seu nome é grego e significa “a deusa Cleópatra, amada de seu pai”. A dinastia ptolomaica assumiu o poder em 305 a.C. depois que Alexandre, o Grande, incorporou o Egito à Grécia – o primeiro Ptolomeu era general de Alexandre. Apesar da origem grega da família, Cleópatra foi a única do clã a dominar a língua egípcia. Acredita-se que era uma mulher muito culta – além do grego e do egípcio, falava aramaico e latim, entre outras línguas.

Sabe-se pouco sobre sua infância e adolescência. A imagem de Cleópatra que perdura até hoje é a de uma mulher bonita e sexualmente ousada. Fontes antigas enfatizam sua inteligência e diplomacia – dizem até que ela escreveu livros sobre pesos e medidas, magia e cosméticos. Há quem diga que ela foi uma das inventoras da maquiagem. Estudos recentes afirmam, no entanto, que de bonita ela só tinha a pele – banhada freqüentemente com leite de cabra e perfumada com óleos exóticos.


Bárbaros: o mundo em transição


No momento em que, em 370, os hunos, liderados por Átila, decidiram cavalgar das estepes asiáticas em direção a oeste, a Europa começou a ficar de pernas para o ar. Apenas 106 anos depois, caía por terra o Império Romano do Ocidente. Tinha início um processo militar, político e social, que transformou para sempre os rumos da História. Furiosos, destemidos, violentos, os hunos começaram a pressionar alguns povos, como ostrogodos e vândalos, que estavam em seu caminho. Para escapar da fúria de Átila e seus guerreiros, essas tribos também passaram a procurar recantos mais seguros onde pudessem se estabelecer. Tarefa nada fácil, já que naquela época o mundo era dominado por uma potência militar, política e econômica: o Império Romano. Com cerca de 6 milhões de quilômetros quadrados, o território latino se estendia de Portugal ao Iraque, do norte da África à Inglaterra. Apesar de alguns conflitos aqui e ali, havia um razoável equilíbrio entre os romanos e os povos por eles dominados. Em alguns casos, até postos do próprio exército imperial eram ocupados pelos germânicos, povo originário de uma região além das fronteiras do império.

A erupção dos hunos detonou um processo irreversível. Era o início de uma era que entrou para a História com o nome de invasões bárbaras. Tradicionalmente esse período abrange os séculos 5 e 6, embora tenham ocorrido invasões de povos bárbaros antes e depois disso, como se verá a seguir. Nessa época, o Império Romano desabou como um castelo de cartas e foi invadido por forasteiros de todos os cantos. “Germânicos de quase todas as tribos marcharam em massa para dentro do império. Foi uma verdadeira inundação humana”, conta o historiador Voltaire Schilling. Mas, afinal, quem eram esses povos que desafiaram o poder romano? Por que passaram a ser conhecidos como bárbaros? De onde vinham?


domingo, 28 de novembro de 2010

Império Árabe: a marcha por Alá


A Europa vivia seus dias mais obscuros, consumida em conflitos sem fim entre reis e senhores cujo poder fragmentado não lhes permitia enxergar (ou ambicionar) nada além de seus próprios feudos. No entorno do Mediterrâneo, no leste do continente, no norte da África, no Egito e na Palestina, os cristãos bizantinos, orgulhosos herdeiros do velho Império Romano, lutavam para manter afastados os persas sassânidas, que controlavam as regiões da Mesopotâmia até a Ásia Central.

Foi quando, na periferia do mundo conhecido no século 7, um homem perto de seus 40 anos, que ganhava a vida conduzindo caravanas pelo deserto, afirmou ter recebido um chamado. O próprio Deus teria ordenado que ele proclamasse pelos quatro cantos que Alá era o único e que ele próprio, Maomé, seria seu mensageiro. Nascia a última grande religião monoteísta. Nascia também um império que em 200 anos se estenderia do sul da Europa até a Índia.

URSS: o gigante se levanta


Quando os operários assumiram o controle das fábricas e os camponeses, das terras, Lenin talvez não imaginasse que os russos ainda sofreriam tanto para que o socialismo se consolidasse na Rússia. Com medo de que os ideais revolucionários se espalhassem pelo mundo, as grandes potências da época apoiaram a contra-revolução e invadiram o país em várias frentes. O Exército Vermelho, organizado por Trotski, conseguiu expulsar os inimigos. “Mas ninguém acreditava que os comunistas se sustentariam no poder por muito tempo”, diz Osvaldo Coggiola, professor titular de História Contemporânea da Universidade de São Paulo (USP).

Embora vitoriosos, diz Coggiola, os bolcheviques tinham sofrido um importante revés durante a Guerra Civil. Em 1920, quando invadiram a Polônia, eles achavam que os operários do país vizinho seriam seus aliados e estariam prontos para um levante proletário semelhante ao russo. Mas estavam enganados. “O espírito nacionalista falou mais alto e os trabalhadores poloneses pegaram em armas contra o Exército Vermelho”, explica o professor. A Polônia acabou se transformando numa verdadeira muralha entre a Rússia e Alemanha, o que impediu o avanço da revolução bolchevique rumo ao Ocidente.

Cuba sem Fidel


O rio Jaimanitas segue, sem pressa, em direção ao mar sempre azul do Caribe. Vindo das montanhas de Quines e Santa Clara, a quilômetros dali, ele não corre: escorre preguiçoso sob o forte sol de janeiro e, quando chega a Havana, suas águas se espalham por 40 metros de largura. O historiador e escritor cubano Enrique Cirules, professor da Universidade de Havana, mora a apenas quatro quarteirões da margem esquerda do rio. Para ele, qualquer um que queira contar a história de Havana, ou de Cuba, deve começar pelo rio Jaimanitas. “Aqui, há quatro séculos os exploradores espanhóis se abasteciam de água para seguir terra adentro, de onde retiravam barcaças cheias de prata, níquel e cobre, enchiam seus galeões e partiam do porto de Carenas seguindo para a Europa”, diz Cirules. Quando o metal acabou, o Jaimanitas viu as multidões de escravos africanos serem trazidas para trabalhar nas plantações de cana. “Não há mais resquícios, mas na margem direita ficava um dos maiores mercados em que os negros eram negociados entre traficantes e fazendeiros”, afirma Cirules, olhando em direção ao vazio. Por fim, as águas verdes do Jaimanitas foram tingidas de sangue. “Aqui, os cubanos armaram barricadas para expulsar os espanhóis e conquistar sua liberdade, em 1868, no primeiro movimento de independência de Cuba, a chamada Grande Guerra.” A luta contra os espanhóis se estenderia até 1898. E esse é o primeiro capítulo da história da Cuba moderna.

Getúlio: Do auge ao suicídio


Getúlio Vargas chegou ao poder em 1930, depois de liderar uma revolução. Foi eleito em 1934. Em 1937, fechou o Congresso e se transformou em ditador. Mesmo assim, era adorado pelas massas, que acompanhavam, empolgadas, a transformação do Brasil em um país com grandes indústrias e leis trabalhistas justas – foi ele quem criou o salário mínimo, por exemplo. Ao final da Segunda Guerra, em 1945, quando a ditadura dos alemães e dos italianos foi derrotada pelas democracias da Europa e dos Estados Unidos, não fazia mais sentido ter um ditador no poder. Getúlio convocou eleições e voltou para São Borja, no Rio Grande do Sul. Mas em 1951 ele voltou à capital, o Rio de Janeiro, reeleito, em grande estilo. Em 1954, Getúlio foi pressionado a deixar o poder. Parecia que ele não tinha escolha, a não ser renunciar. Mas ele tinha, sim. Às 8h30 da manhã do dia 24 de agosto, pegou seu Colt calibre 32 com cabo de madrepérola e, sentado na cama, de pijamas, apontou contra o próprio peito e atirou. Como é possível que um ditador tão popular que consegue se eleger de novo termine desse jeito?

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Escravidão: dez passos para a liberdade


Por cerca de 300 anos, mais de 3 milhões de africanos fizeram uma viagem sem volta e sem garantias para o Brasil. O país passou por um lento processo – foi o único que já era independente que ainda tinha escravos às portas do século 20 –, cheio de interesses políticos e econômicos, até chegar à abolição da escravatura e dar liberdade, ao menos simbólica, para os negros.

1810 - Acordo inglês

O primeiro passo para que a abolição se tornasse um fato no Brasil foi a assinatura de um tratado com a Inglaterra pela causa da humanidade. Aceito a contragosto pelo príncipe João (futuro rei João VI) – que se viu obrigado a cooperar com os britânicos que o escoltaram em sua viagem de exílio ao Brasil –, o acordo teria como conseqüência a gradual extinção do comércio de escravos no país.


Guerra do Paraguai: briga entre Hermanos


O brasileiro que aprendeu sobre a Guerra do Paraguai na escola depois da década de 60 tem motivos para se envergonhar de seu país. Afinal, a versão sobre o conflito disseminada pelos livros didáticos é que o Brasil, a Argentina e o Uruguai foram usados em uma guerra arquitetada pela Inglaterra para arruinar o Paraguai. Mas eis que surge um alento para a nossa auto-estima. Uma recente revisão sobre as causas da guerra aponta que a tese da conspiração inglesa é pura fantasia. Na realidade, afirmam os defensores da nova versão, o conflito entre os países sul-americanos foi motivado por disputas de território e poder na região do rio da Prata.

A Guerra do Paraguai se estendeu por mais de cinco anos, de dezembro de 1864 a março de 1870. Logo que ela terminou surgiram relatos sobre as batalhas e seus heróis, mas as causas históricas que motivaram o conflito foram relegadas a segundo plano. Isso porque ninguém questionava o fato de o presidente paraguaio, Solano López, ter sido um ditador sanguinário e megalomaníaco que conduziu seu país a uma guerra sem chances de vitória. Odiado por todos, López era visto como o grande causador do conflito.


quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Buda: um príncipe encontra a perfeição


Buda percorria certa vez um caminho quando um homem, percebendo que estava diante de um ser incomum, perguntou-lhe: Você é um deus? E o Buda respondeu: Não. É um demônio? E o Buda respondeu: Não. É um homem? E o Buda respondeu: Não. Quem é você, então?


O guerreiro Ramsés II


A entrada da cidade está coberta de cadáveres. Desesperado, o sacerdote queima resina em um fogareiro, num ritual de magia, pedindo socorro aos deuses enquanto chora pelos mortos. Não funciona. O poderoso Exército egípcio parece invencível. Acaba de romper a machadadas as portas da fortaleza, o último baluarte de resistência de Biblos, a capital do reino de Amurru (no atual Líbano), aliado dos hititas.

A conquista de Biblos, em 1285 a.C., é um marco na história. Sob o comando de Ramsés II, o Egito está para se tornar o maior império do mundo antigo. Poderoso e rico, o país se tornará uma potência militar, conquistará territórios dos hititas ao norte, dos assírios a leste e dos núbios ao sul, até atingir seu tamanho máximo. Trará escravos, novas matérias-primas e tecnologia. Será o apogeu econômico e cultural do Egito.


quarta-feira, 24 de novembro de 2010

O verdadeiro rei Artur


As histórias de nobreza e cavalaria fizeram dele um mito na Idade Média. Um personagem da ficção, não da história. No entanto, alguns especialistas acreditam que ele teria de fato existido e que, por trás dos contos de magos e bruxas, talvez tenha havido um homem real. Quem era ele?

Não há quem não tenha ouvido falar, pelo menos uma vez, do rei Artur e de sua corte de jovens e bravos vassalos. Ostentando portentosas armaduras, combatendo pela honra de suas amadas e habitando grandes castelos, eles evocam os ideais da cavalaria, típicos da Idade Média. Da literatura às óperas, das artes plásticas ao cinema de Hollywood, poucos personagens mereceram tanta atenção e tornaram-se tão conhecidos. Mas, afinal, o rei Artur existiu?


Erwin Rommel: a raposa do deserto


"O senhor é muito rápido para nós”, disse o general francês logo após se render ao comandante inimigo. A frase soaria frágil e covarde, não fosse dirigida a um dos mais astutos e mitológicos personagens dos campos de batalha. O tal “senhor”, no caso, é um general que conseguiu feitos inacreditáveis nas mais adversas situações. Colecionador de ações antológicas nas duas grandes guerras que a humanidade já assistiu, Erwin Rommel era um alemão ágil e sabido, que em pouco tempo se tornou o mais famoso estrategista da Segunda Guerra Mundial. Com suas tropas, conseguiu avançar cerca de 240 quilômetros em apenas 24 horas, feito que nenhum outro general foi capaz de produzir naqueles tempos. Logo ganhou o apelido de “A Raposa do Deserto”, após fortalecer as combalidas tropas italianas de Mussolini no norte da África, em 1941, e, de quebra, fazer as avançadas tropas britânicas recuarem no front africano.

Filho de um professor universitário com uma jovem de ascendência nobre, Rommel nasceu em 1891 na cidade de Heidenheim. Desde a infância, mostrava gosto por aviões e planadores, mas acabou ingressando aos 18 anos no 124º Regimento de Infantaria de Württemberg. Nas cartas trocadas com a mulher, durante o período em que esteve no deserto, transparece um dedicado pai de família, interessado com o desempenho escolar do único filho, a quem sempre cobria de elogios. Qualidade, por sinal, que também era vista na sua relação com os soldados. Sem grosserias, calmo, ensinava técnicas de combate salientando que a ousadia e a surpresa eram as grandes armas de um exército.


terça-feira, 23 de novembro de 2010

Alexandre, o maior


A pequeno Alexandre gostava de desafios. E dos grandes. Aos 9 anos de idade acompanhou o pai, Felipe II, a uma feira de cavalos. O monarca da Macedônia passava diante dos animais olhando-os com a cobiça que os homens hoje reservam aos carros possantes. Já tinha separado algumas Ferrari e Mercedes quando um corcel negro lhe foi oferecido. Ele era lindo, uma montanha de ossos e músculos imponente, a montaria de um rei. Felipe o queria e seus assessores se apressaram em adquiri-lo, mas depararam com um problema: ninguém conseguia montá-lo. Estavam para desistir da compra quando o jovem Alexandre disse que aquilo não era motivo para dispensar o animal. Felipe, então, desafiou o filho a domá-lo. O menino sabia montar, mas sabia também que para enfrentar um animal daquele tamanho não bastariam força e habilidade, era preciso estratégia. Com habilidade incomum, Alexandre puxou a cabeça do cavalo em direção ao Sol. A cegueira momentânea confundiu o animal e deu tempo para que ele pudesse dominá-lo. Emocionado, papai Felipe não se conteve. “Garoto, você precisa encontrar um reino grande o suficiente para suas ambições. A Macedônia é muito pequena para você.” O próprio Alexandre adorava contar essa história, segundo relata o historiador grego Calístenes, que viveu de 346 a 289 a.C. e acompanhou muitas das expedições militares do rei.


A batalha de Arsuf


Corria o ano de 1191 e a situação era difícil para os cruzados na Terra Santa. Jerusalém estava novamente sob domínio dos muçulmanos, que haviam reconquistado a cidade quatro anos antes, bem como a maior parte do território que os cristãos chamavam de Outremer, estabelecido após a Primeira Cruzada em áreas que hoje correspondem a Israel, Palestina, Jordânia e Líbano. A perda de Jerusalém motivara uma nova Cruzada, a Terceira, que, depois de muita confusão, incluindo a morte de alguns de seus principais líderes, ficou sob comando do rei inglês Ricardo I, também conhecido como Ricardo Coração de Leão. Ricardo sabia que, para atacar Jerusalém com sucesso, era preciso garantir suas linhas de abastecimento, capturando a cidade portuária de Joppa (a atual Jaffa, em Israel). Com esse objetivo, no final de agosto de 1191, ele saiu da cidade de Acre em direção a Joppa, à frente de quase 30 mil homens e de uma longa caravana de camelos e mulas, carregados com suprimentos para tomar aquele porto estratégico.


segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Glória feita de sangue


"Vendo tantas cidades e vilas situadas na água e outras tantas aldeias em terra firme, fomos tomados de admiração. Por causa das grandes torres e pirâmides que se elevavam da água, alguns soldados chegavam mesmo a se perguntar se aquilo não era um sonho." As palavras são de Bernal Diaz del Castillo, escrivão do conquistador espanhol Hernán Cortéz, que chegou à região da atual Cidade do México em novembro de 1519. O deslumbre é justificado. Tenochtitlán, a capital do Império Asteca, era uma metrópole de 15 quilômetros quadrados, incrustada num lago, interligada às margens por calçadas artificiais e entrecortada por uma rede de canais e aquedutos. Não fossem os habitantes tão estranhos aos olhos europeus, a cidade se confundiria com Veneza - só que mais bonita e higiênica.

Cortéz e seus homens foram bem recebidos. Montezuma II, o imperador dos astecas, não sabia o que pensar daquele capitão de cabelos dourados montado em um cavalo, animal nunca antes visto por ali. Poderia ser o deus Quetzalcoatl que retornava à Terra. Na dúvida, achou sábio fazer um agrado. Entre pedras preciosas e iguarias, o imperador ordenou que seus mensageiros presenteassem o estrangeiro com um banquete de carne humana. Os espanhóis desconfiaram do cheiro forte de sangue e descobriram, horrorizados, o que estavam comendo. Vomitaram imediatamente e não aceitaram mais nenhum alimento. Era um mau sinal. Fossem eles deuses ou não, as coisas não seriam nada fáceis para os astecas. Dois anos depois, sua civilização estava dissolvida. Desaparecera tão rápido quanto havia se desenvolvido.


Constantinopla: a queda da última estrela do Império Bizantino


Os presságios para os bizantinos no dia 24 de maio de 1453 eram os piores possíveis. Nesse dia, um eclipse lunar lembrou a todos os que resistiam ao cerco otomano, imposto pelo sultão Maomé II desde o dia 6 de abril, que uma antiga profecia estava para se cumprir. A lenda dizia que a bela Constantinopla (atual Istambul, na Turquia), a jóia do Oriente e capital do Império Bizantino, resistiria a seus inimigos enquanto a Lua brilhasse firme no céu. Para o desespero da população, os sinais da desgraça que estava para se abater sobre os homens do imperador Constantino XI não pararam por aí. No dia seguinte, um ícone da Virgem Maria se espatifou no chão durante uma procissão e, na seqüência, uma chuva de granizo inundou as ruas, encharcando os mais de 22 km de muralhas que protegiam a cidade.

Para muitos, a culpa era da política de reaproximação com as nações católicas do Ocidente promovida pelo imperador e iniciada ainda no reinado de seu pai, João VIII. Preocupado com o isolamento de seu império desde o cisma entre as igrejas católica e ortodoxa, em 1054, Constantino não podia imaginar que, ao exigir uma anuidade de Maomé para sustentar um príncipe otomano prisioneiro em Constantinopla, estava dando início a sua própria destruição. Pois o sultão considerou a cobrança da taxa uma afronta pessoal e imediatamente começou os preparativos para iniciar o cerco.


domingo, 21 de novembro de 2010

Árabes X Judeus: as sementes da discórdia


Está em curso a Primeira Guerra Mundial. Jerusalém, cidade sagrada para cristãos, judeus e muçulmanos, ainda é controlada pelos turcos otomanos, parceiros de alemães e austro-húngaros no conflito. Do outro lado da briga está a Tríplice Entente, liderada por britânicos, franceses, russos e, a esta altura, também por americanos. Os britânicos avançam sobre a Terra Santa, na bem-sucedida Campanha da Palestina. Estamos em 1917 e a guerra já caminha para sua fase final. Mas ainda há tempo para abrir um novo capítulo na história do Oriente Médio.

No dia 11 de dezembro daquele ano, o general Edmund Allenby e cerca de 20 oficiais de Sua Majestade entram na Cidade Velha de Jerusalém pelo portão de Jaffa. Era o fim da era otomana. Dali em diante, a Palestina seria controlada pelos britânicos. A tomada de Jerusalém fora pedida ao general Allenby pelo primeiro-ministro Lloyd George, como um “presente de Natal” para a população da Grã-Bretanha. Cristãos finalmente voltavam a dominar o lugar onde nascera e morrera Jesus Cristo. Mas o que os britânicos ganharam ao assumir o controle do território palestino não foi exatamente um “presente”.


Os vikings descobriram a América?


Foi Leif Eriksson, e não Cristóvão Colombo, quem descobriu a América. O explorador viking chegou ao continente americano cerca de 500 anos antes do navegador genovês. Isso mesmo. Apesar de nos livros escolares geralmente a gente aprender que o Novo Mundo foi conquistado em 1492, na verdade sua descoberta ocorreu por volta do ano 1000. Essa teoria é conhecida há décadas, mas só nos últimos anos os estudiosos conseguiram descobrir mais detalhes sobre a aventura viking.

As sagas vikings sempre falaram de uma mítica Vinland, ou terra das vinhas, que teria sido descoberta na virada do século 10 para o 11. No entanto, até os anos 60 não havia qualquer prova de sua existência. A confirmação só ocorreu quando o explorador norueguês Helge Ingstad e sua mulher, a arqueóloga Anne Stine Ingstad, encontraram, com a ajuda de pescadores, vestígios de um assentamento nórdico em L’Anse aux Meadows, na costa da ilha de Terra Nova, no Canadá. Datações feitas por carbono 14 indicaram que os vestígios são mesmo do ano 1000, o que coincide com os relatos vikings sobre a viagem de Eriksson. A localização e as características dessas ruínas também estavam de acordo com o descrito pelos contemporâneos de Eriksson. Todas as evidências, juntas, fizeram com que o mito viking ganhasse consistência. Considerado o mais antigo assentamento europeu no Novo Mundo, o local foi declarado Patrimônio da Humanidade pela Unesco, em 1978.


sexta-feira, 19 de novembro de 2010

AI-5: licença para matar


O documento era pequeno. Com quatro páginas e 12 artigos, era possível lê-lo em menos de cinco minutos. Foi discutido em poucas horas e teve apenas um voto contra. Ao ser assinado, mudou a face do Brasil e o mergulhou nas trevas. O Ato Institucional número 5 (AI-5) foi aprovado em uma reunião do Conselho de Segurança Nacional, comandada pelo presidente do país, o marechal Costa e Silva, em 13 de dezembro de 1968. Foi um fecho autoritário para um ano em que o sonho de liberdade soprou como nunca: as lutas estudantis viraram de cabeça para baixo cidades do Brasil e do mundo. A idéia era colocar “a imaginação no poder”, como dizia um lema da época. Para os mais politizados, o objetivo era provocar “um, dois, três, mil Vietnãs, que o imperialismo será derrotado”. Na França, as agitações tiveram seu peso, e Charles de Gaulle quase foi deposto. Nos Estados Unidos, o presidente americano Lyndon Johnson perdeu força e desistiu da reeleição.

No Brasil foi diferente. Militares reprimiram com violência as manifestações contrárias ao regime, fossem greves, passeatas ou manifestações culturais. Mataram estudantes. Invadiram teatros. E, quando o ano estava para terminar, editaram o AI-5. O novo tempo nem havia começado e já terminava, abatido com um só golpe.


A descoberta da Europa


Numa terra praticamente virgem, homens, mulheres e crianças viviam em bandos de 60 ou 100 indivíduos. Isolados uns dos outros, os maiores podiam chegar a 400 pessoas. Alimentavam-se do que conseguiam com uma agricultura muito rudimentar, da caça e do que simplesmente catavam no mato. Eram seminômades, ou seja, ficavam num lugar apenas tempo suficiente para comer o que estava ao seu alcance, aí levantavam acampamento e iam embora. Suas vilas eram mesmo pouco mais que isso: acampamentos. Não construíam muita coisa além de totens ou amontoados de pedras. Não criaram escrita. Não tinham sistema político e seus líderes eram uma mistura de patriarca com guia espiritual. Viviam como selvagens. E eram europeus.

Estamos em 3000 a.C. e, nessa época, o centro do mundo não é a Europa. A 5 mil quilômetros dali, na Mesopotâmia, região entre os rios Tigre e Eufrates, no atual Iraque, vicejam cidades com mais de 10 mil habitantes. Lá os sumérios desenvolvem leis e códigos para orientar a vida em sociedade. No norte da África, o Baixo e o Alto Egito se unem para formar um dos maiores impérios do mundo antigo, capaz de erguer colossos, como a enorme esfinge de pedra a espiar a planície de Gizé. Eles constróem canais e dominam os ciclos de cheia do rio Nilo. No Extremo Oriente, pequenos reinos vivem sob um só signo: o dragão. A China está prestes a despertar, mas já domina a matemática e a agricultura. Nos três cantos, a pré-história ficou para trás. Eles inventaram a escrita. E com ela preenchem notas fiscais, escrevem livros sagrados, assinam recibos, contratam serviços, registram casamentos e filhos. Fazem cálculos e poesia. Inauguram a história.


quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Os últimos dias de Hitler


O führer tombou. Com a mais profunda tristeza e reverência, o povo alemão se curva ante o chefe morto.” Essas palavras soaram como uma bomba – talvez a pior delas – em toda a Alemanha na manhã do dia 1º de maio de 1945. Foram transmitidas por uma rádio de Hamburgo como um comunicado oficial escrito pelo almirante Karl Dönitz. Dois dias antes, Adolf Hitler o nomeara chefe de estado e do Exército alemão. O líder nazista se suicidou com um tiro na cabeça no bunker que ele mandou construir em Berlim.

A bala encerrava de uma vez por todas um dos mais macabros capítulos da história, em que foi promovido o pior genocídio do século 20. Mais de 12 milhões de pessoas morreram debaixo da égide do regime nazista, comandado por Adolf Hitler e que durou pouco mais de 12 anos na Alemanha.


Ecos da revolução francesa


A economia francesa era uma das mais fortes no fim do século 18. No comércio exterior, a França movimentava cifras equivalentes a 1 bilhão de libras, ficando atrás apenas da Inglaterra e da Espanha. Internamente, contudo, o país sofria de graves problemas. Para começar, os 97% da população que formavam o Terceiro Estado (camponeses, pequenos proprietários de terras, servos, artesãos e burguesia) arcavam com toda a carga tributária que sustentava o Primeiro Estado (clero) e o Segundo Estado (nobreza). Para complicar, o comércio e a indústria levaram à estagnação dos negócios: empresas fecharam, aumentando o desemprego. Clima de ebulição social.


San Martín: o libertador da América


Janeiro de 1817. O vento gélido dos Andes penetrava fácil nos uniformes esfarrapados de um dos exércitos mais obstinados das Américas. Os ponchos doados pelas mulheres identificadas com a causa da libertação não eram capazes de resguardar o calor da tropa. As alturas das montanhas, que tantas vidas cobraram, eram o primeiro e, talvez, o mais cruel inimigo daqueles homens. A cada passo, o objetivo parecia ficar mais distante. Entre os cavalos e mulas que levavam soldados e mantimentos, somente os mais fortes e afortunados sobreviveriam. Para aqueles que acreditaram no ideal da revolução, não seria diferente. Mas no comando daquelas centenas de homens havia um general determinado e em busca de seu grande ideal: um continente livre e soberano.

Quase trinta e nove anos antes, no dia 25 de fevereiro de 1778, num povoado às margens do rio Uruguai chamado Yapeyú – atual província de Corrientes, na Argentina –, nascia José Francisco de San Martín. O sangue dos colonizadores corria forte em suas veias. Ele era o quinto filho do governador da região, o capitão espanhol Juan de San Martín, e de Gregória Matorras, descendente de uma família de conquistadores também espanhóis. Logo aos 6 anos, a ligação de seu pai com a terra natal o levaria pela primeira vez ao Velho Continente. Foi na Espanha que San Martín iniciou sua bem-sucedida carreira militar. Aos 13 anos, ele já participava de seu primeiro combate, durante o sítio à atual Argélia.


Simón Bolívar: meu sonho de liberdade


"Juro pelo amor do Deus de meus pais. Juro por eles. Juro pela minha honra e juro pela minha pátria que não darei descanso a meu braço, nem repouso a minha alma, até que haja rompido as correntes que nos oprimem por vontade do poder espanhol!” Esse compromisso, assumido por Simón Bolívar quando ele tinha pouco mais de 20 anos, foi levado às últimas conseqüências. O Libertador, como ficou conhecido, coordenou as campanhas militares responsáveis pela independência de cinco países sul-americanos: Colômbia, Venezuela, Equador, Peru e Bolívia. Vitorioso, passou a lutar pela união das nações latino-americanas e por justiça social. Em pouco tempo, essas causas acabariam levando-o à ruína.

Bolívar nasceu em Caracas, na então América Espanhola, no dia 24 de julho de 1783. Sua família pertencia à elite da colônia. Perdeu o pai aos 3 anos e a mãe aos 9. Aos 15, foi enviado a Madri para concluir os estudos. Na capital da metrópole, ele conheceu a espanhola Maria Teresa Toro, com quem se casou em 1802. Retornou para Caracas, onde poderia ter vivido em paz cuidando dos negócios familiares. Mas a fatalidade voltaria a castigá-lo: dez meses depois de chegar à América, sua esposa morreu de tuberculose. Bolívar decidiu nunca mais se casar. A causa da independência se tornaria, assim, sua principal paixão. Em 1805, Bolívar fez uma viagem a pé pela Itália junto com seu tutor Simón Rodríguez. Diante dele, no alto do monte Sacro, em Roma, Bolívar fez o juramento que abre este texto. No ano seguinte, voltou à sua terra natal. Estava pronto para a primeira grande luta de sua vida.


terça-feira, 16 de novembro de 2010

JK: o Brasil que quase deu certo


Imagine um país que fosse campeão mundial em otimismo. Que fizesse bonito não só no futebol, mas também no tênis, no boxe e no atletismo. Pense num povo que pudesse se orgulhar de produzir uma música sofisticada, que conquistasse as paradas de sucesso de todo o mundo. Imagine uma nação que conquistasse, de uma só vez, o maior prêmio do festival de cinema de Cannes e também o Oscar de melhor filme estrangeiro. Pense numa economia em que as indústrias se multiplicassem rápido, os dólares não parassem de entrar e a produção de petróleo aumentasse 15 vezes em cinco anos. E imagine ainda que essa terra tivesse uma nova capital, construída do zero, e que ela fosse a cidade mais moderna do planeta inteiro.

Esse país, acredite, existiu. E o mais incrível: era o Brasil. Na segunda metade da década de 50, parecia que havíamos chegado lá, que nunca mais seríamos uma nação rural, doente, analfabeta e condenada ao subdesenvolvimento. O maior responsável por isso era o presidente Juscelino Kubitschek, uma figura sorridente e jovial que conduziu o país do trauma da morte de Getúlio Vargas para a alegria de pertencer ao Primeiro Mundo – ainda que só por alguns anos.


Bandeirantes: destruir para dominar


Filhos de portugueses com mulheres da terra, os bandeirantes eram muito parecidos com os índios. Andavam por aí descalços e com roupas para lá de estropiadas – e não com roupas e botas de couro limpinhas, como muita gente acredita. Durante 200 anos, entre os séculos 17 e 18, esses homens, saídos principalmente de São Paulo, se embrenharam no mato para buscar índios, que eles capturavam para usar em suas próprias fazendas ou vender como escravos. Graças a eles, o Brasil ficou muito maior do que deveria ser, já que o Tratado de Tordesilhas, assinado entre Espanha e Portugal em 1494, dava aos portugueses só o nosso litoral. Os bandeirantes aumentaram o tamanho do nosso país, mas também provocaram um rombo de população. Eles mataram e prenderam tantos índios que o nosso interior ficou bem mais vazio.

O primeiro bandeirante da história é o português João Ramalho, que, ainda no começo do século 16, fez amizade com a poderosa tribo dos tupiniquins. Esperto e violento, esse pioneiro tinha várias esposas e uma multidão de filhos. Por um lado, foi ele quem garantiu o apoio dos índios para fundar a cidade de São Paulo. Por outro, sua aliança com os tibiriçás provocou o fim de outras tribos, como os tupinambás. Quando o rei de Portugal estimulou uma parceria com os tupinambás, um processo parecido aconteceu no interior da província.


segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Marquês de Pombal contra o velho mundo


Em 1723, o português Sebastião José de Carvalho e Melo raptou Teresa de Noronha e Bourbon Mendonça e Almada, uma formosa viúva pertencente à mais alta elite de seu país. Casaram-se contra a vontade da família dela, que não via com bons olhos sua união com um obscuro membro da pequena nobreza. O matrimônio não gerou filhos, mas foi uma amostra da ousadia do homem que mudaria o destino de Portugal. O futuro marquês de Pombal era tudo, menos um romântico sonhador. Da mesma maneira que traçou com mão de ferro as linhas de sua vida pessoal, Carvalho e Melo conduziu os portugueses após um dos mais terríveis desastres naturais da história da humanidade: o terremoto de Lisboa, que devastou a capital portuguesa em 1755.

A figura do marquês entrou de modo ambíguo nos livros de história. Ora retratado como déspota esclarecido, ora como ditador sanguinário, muitos foram os adjetivos usados para descrever o poderoso ministro, que comandou Portugal durante o reinado de José I. Ninguém questiona, entretanto, o fato de que Pombal tornou-se um marco na história do império português – que, na época, incluía o Brasil. Nascido em 1699, Carvalho e Melo não deu mostras na juventude de que seria um grande líder. Por influência de seu tio Paulo de Carvalho, que dava aula na Universidade de Coimbra, ele conseguiu se matricular naquela instituição. Mas logo abandonou os estudos para entrar no exército, onde não conseguiu passar do posto de cabo. Desiludido, decidiu estudar Direito e História – o que lhe rendeu, aos 34 anos, um posto na Academia Real da História.


Roma no auge


Ruas repletas de pessoas, a maioria suja e malvestida. Casas minúsculas amontoam-se pelas ladeiras. Crianças e mendigos esmolam por toda parte. Muitos pobres dormem ao relento, em frente a comércios, mercados e fontes. Nos muros, propagandas políticas e declarações de amor. A sujeira contrasta com modernos e belíssimos prédios de mármore, endereço de instituições públicas. Nas regiões mais nobres da cidade, construções majestosas e imponentes abrigam as famílias ricas e seus escravos. Dentro dos palacetes, não raro as festas, com fartura de comida e bebida, evoluem para uma orgia.

São Paulo, Nova Délhi, Cidade do México? Nada disso. Falamos de Roma, por volta do século 2, a capital do império mais importante e poderoso que o mundo já conheceu. Em seu ápice, ela era quase idêntica às metrópoles atuais (mas sem a poluição no ar, claro). Aliás, Roma era ainda mais apinhada que os exemplos anteriores: no ano 200 alcançou 1 milhão de habitantes e sua densidade demográfica atingiu 66 mil pessoas por km2 (hoje, a cidade mais apertada do mundo é Mumbai, na Índia, com 29650 pessoas por km2).


Waterloo: a última batalha de Napoleão


Os últimos dias de março de 1815 foram azedos para os diplomatas reunidos em Viena. Ali, representantes de Rússia, Prússia, Áustria, Suécia, Inglaterra e várias nações e reinos menores tentavam, havia meses, redesenhar o mapa político da Europa, reinstaurando as monarquias e os territórios que existiam antes do furacão napoleônico. Porém a ilusão de que o general corso estava liquidado acabou quando souberam que ele não só havia retornado do exílio em Elba (uma ilhota no Mediterrâneo), como no dia 20 de março fora recebido em glória em Paris. Os aliados mal puderam acreditar. Napoleão, dez meses antes, em 11 de abril de 1814, fora derrotado por uma coalizão de mais de 500 mil soldados de várias nações européias, que se sublevaram contra o domínio francês após a desastrosa campanha napoleônica na Rússia, em 1812. Vitoriosos, os aliados colocaram Luís XVIII no trono da França e enviaram Bonaparte ao exílio. Agora, quando estavam prestes a dividir o bolo, teriam de brigar novamente com seu pior pesadelo. E em etapas longas, até a definição, na batalha conhecida como Waterloo.


Isabel, a princesa do Brasil


Isabel Cristina comemorou seu aniversário de 39 anos, em 1885, com uma solenidade no Paço Municipal da capital, o Rio de Janeiro. Sentada, tendo a seu lado o marido, foi a estrela da cerimônia em que diversos escravos foram alforriados.

Conforme os nomes dos beneficiados eram anunciados pelo vice-presidente da Câmara, João Florentino Meira de Vasconcellos, eles seguiam para receber seus certificados de libertação das mãos de Isabel. Cada ex-escravo curvava-se e, em sinal de respeito e gratidão, dava um beijo na mão da aniversariante. A relação de afeto entre a mulher e os negros começava a ser demonstrada publicamente.


domingo, 14 de novembro de 2010

14 Bis: o dia da consagração


Vinte e um segundos e meio depois, Alberto Santos Dumont estava novamente no chão do Campo de Bagatelle, em Paris, ileso e feliz, pronto para ser carregado nos ombros do conde Jacques Fauré. Naquele 12 de novembro de 1906, às 16h45min, ele tinha acabado de voar uma distância de 220 metros, a seis metros de altura, com o 14 Bis. Era a confirmação de um feito. Alguns dias antes, em 23 de outubro, também em Bagatelle, as centenas de parisienses que assistiram ao vôo de 60 metros daquele aeroplano em forma de pato já não duvidavam de que era possível decolar, voar e pousar uma máquina mais pesada do que ar. Mas Dumont precisava provar aos especialistas da Federação Aeronáutica Internacional, a FAI, que o aparelho não tinha sido beneficiado pelo vento, a única pendência que restara do vôo anterior. Além disso, o brasileiro teria de fazer um vôo completo de cem metros para ganhar o prêmio de 100 mil francos do Aeroclube da França, mais um em sua bem-sucedida carreira de aviador. Ele fez mais: terminou o dia 12 de novembro com os primeiros recordes homologados de distância, altitude e velocidade da aviação.


Divino Júlio César


Muita gente acha que os gênios já nascem prontos. Todo mundo conhece a história de Mozart encantando soberanos da Europa com meros 5 anos de idade, ou de Pelé deixando os suecos boquiabertos quando não passava de um meninote de 17. Mas, para o homem cujo nome virou sinônimo de imperador e general, as coisas aconteceram bem mais devagar. Ele teve de esperar a maturidade para mostrar a que veio, galgando o poder aos poucos, de mansinho – ascensão que, aliás, combinava bem com a personalidade desse mestre conciliador. César governou para valer os gigantescos domínios de Roma por apenas quatro anos, mas a influência do “Divino Júlio”, como seus conterrâneos passaram a conhecê-lo depois da morte, dura mais de dois milênios.

Ganhar fama de divino, aliás, era algo que andava nos planos da família de Caio Júlio César desde que Roma era Roma. Ou quase: há quem diga que, na verdade, a família chamada Iulia viera de Alba Longa, uma cidade vizinha, onde nasceu Rômulo, o fundador de Roma. Mania de grandeza à parte, o fato é que o jovem Júlio, nascido por volta do ano 100 a.C. (não se sabe a data exata), não teve muita chance de lucrar com sua origem divina durante a juventude. A coisa mais esperta a fazer era ficar de boca fechada, porque ele cresceu durante um dos períodos mais turbulentos da história romana. Por séculos, a cidade-estado tinha sido governada pela esquisita mistura de oligarquia e democracia que os romanos chamavam de república, com o poder distribuído desigualmente entre os legisladores do Senado, o “poder executivo” representado pelos cônsules e a pressão constante do povo romano, que participava de eleições e era representado pelos tribunos.


sábado, 13 de novembro de 2010

Camarada Ernesto Che Guevara


Ele abandonou a medicina, a família e seu país para conhecer a América e os americanos. Acabou se transformando num guerrilheiro e lutando pela independência em uma pequena ilha do Caribe, da qual pouco sabia. Morto antes de completar 40 anos, tornou-se um dos símbolos do século 20

O muro de Berlim caiu em 1989, levando junto a União Soviética e uma penca de regimes do “socialismo real”, mas Ernesto Che Guevara sobreviveu. Argentino de nascimento, cubano por adoção e latino-americano por vocação, o jovem que se tornou guerrilheiro e a mais influente figura da Revolução Cubana, só abaixo de Fidel Castro, foi executado em 9 de outubro de 1967 por uma unidade do Exército boliviano treinada pela CIA, a agência de inteligência do governo dos Estados Unidos.


Ieyasu Tokugawa, o destemido senhor da guerra


De cada lado do desfiladeiro há mais de 80 mil homens. Alguns enchem seus mosquetes com pólvora e chumbo, outros desatam suas longas espadas da cintura. Todos vestem armaduras parecidas e apenas pedaços de papel colorido amarrados na bainha da espada ou da roupa os diferenciam em meio ao forte nevoeiro que desce com o nascer do dia. Com um sinal de sua bandeira, o velho senhor da guerra Ieyasu Tokugawa sinaliza a seus homens que é hora de derramar o sangue daqueles que o desafiaram. A mais decisiva das batalhas travadas em solo japonês, enfim, começa.

Era 21 de outubro de 1600, o dia em que um Japão unificado começou a emergir. A batalha de Sekigahara, que causou mais de 30 mil mortes, pôs fim às disputas entre senhores feudais. A partir dali, todos obedeceriam a um só líder: o xogum Tokugawa, o mais poderoso de todos os detentores do título até então.


sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Onde nasceu o Brasil?


Onde, como e quando nasceu o Brasil da civilização européia? No instante em que a esquadra de Cabral avistou um “monte mui alto e redondo” silhuetado contra o fulgor do entardecer de 22 de abril de 1500? No momento em que o capitão Nicolau Coelho trocou um sombreiro por um cocar com os indígenas que se reuniram na praia no alvorecer do dia seguinte? Dois meses e 27 dias antes, quando, em 26 de janeiro de 1500, o capitão espanhol Vicente Pinzón avistou terra – possivelmente a ponta de Mucuripe, no Ceará? Ou em algum momento de 1498, quando uma expedição secreta, talvez comandada pelo grande Bartolomeu Dias, teria deixado um degredado (que entrou para a história com o nome de “Bacharel de Cananéia”) no local onde passava a linha de Tordesilhas, no litoral sul de São Paulo? Em todos esses momentos ou nenhum deles?

As fabulações da história, mesmo as que deixam rastros em documento, são sempre múltiplas. Assim, dadas as incertezas que, de uma forma ou de outra, pairam sobre as alternativas acima, não é despropósito acrescentar nova hipótese à lista: o Brasil dos europeus – o Brasil que fala português – nasceu com a instalação da “feitoria do Cabo Frio”, construída em dezembro de 1503 sob a supervisão do florentino Américo Vespúcio.


Maria Antonieta: A última rainha


Virar ícone de uma época – representar uma classe, um modo de pensar e de viver – é destino para poucas pessoas. Uma delas, sem dúvida, foi a austríaca Maria Antônia Josefa Johanna von Habsburg-Lothringen, ou simplesmente Maria Antonieta. O problema é que, dependendo de quem a julga, ela é vista de jeitos completamente diferentes. A controvérsia começou ainda na época de sua morte, no fim do século 18. De um lado, era tida como símbolo da arrogância e da insensatez da monarquia francesa. De outro, era admirada como uma mártir, quase uma santa, sacrificada por loucos que tinham se voltado contra a ordem sagrada das coisas.

Durante muito tempo, a discórdia prosseguiu e, no meio da briga, sobrava pouco espaço para quem queria conhecer a Maria Antonieta de carne e osso. Nos últimos anos, porém, historiadores têm se esforçado para trazer à tona uma imagem mais equilibrada da rainha. Os novos estudos mostram que Maria Antonieta não foi uma mulher fútil e ingênua, mas uma mestra em usar o glamour como arma para se firmar numa corte estranha e hostil.


quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Dom Pedro I: a volta do imperador


Desde criança, todo brasileiro está acostumado a ver dom Pedro I de pelo menos duas maneiras. A primeira é aquela dos livros didáticos, com sua pose sisuda, porte imperial e tão (pouco) atraente como uma estátua mal conservada em praça pública. A segunda versão, mais popular, é a do dom Pedro intempestivo, mulherengo, uma espécie de latin lover (se você tem mais de 30 anos, provavelmente lembra do então galã Tarcísio Meira no filme Independência ou Morte, reprisado inúmeras vezes na Sessão da Tarde durante a década de 1980). Enfim, o português temperamental que proclamou a independência em um acesso de fúria à margem do rio Ipiranga, em meio a um forte desarranjo intestinal.

O que pouca gente sabe é que, entre essas duas versões, há outra face de dom Pedro bem menos conhecida no Brasil que só agora começa a ser resgatada. “Ele se tornou um símbolo de liberdade na Europa na década de 1830”, diz Isabel Vargues, professora de História da Universidade de Coimbra, em Portugal. “Em meio a inúmeros monarcas conservadores que estavam de volta ao poder nesse período, Pedro IV foi considerado um estadista moderno que inaugurou um período liberal no país.” (Não estranhe: “Pedro IV” é como nosso dom Pedro I passou a ser chamado pelos portugueses após ser proclamado rei em sua terra natal.)


Zumbi, esse desconhecido


O nome dele era Zumbi, mas talvez o certo fosse Zambi. Ele pode ter nascido na África e ter sido trazido para cá à força, mas há quem diga que ele era brasileiro e livre. Nem temos certeza de que ele era filho de africanos – se ele nasceu no Brasil, é possível que seu pai fosse africano e sua mãe, índia. Sua morte também é envolta em mistério. Só não existem dúvidas a respeito de uma coisa: até seus adversários o definiam como um homem forte, orgulhoso, inconformado com sua condição social, que resolveu enfrentar seus algozes e libertar seu povo. E ele foi longe nesse objetivo. O Quilombo dos Palmares deu trabalho ao governo de Portugal.

O quilombo foi construído na serra da Barriga, uma área que hoje faz parte do estado de Alagoas. O terreno era uma espécie de fortaleza natural: tinha barrancos que dificultavam o acesso e palmeiras fazendo uma espécie de muralha. Palmares surgiu por volta de 1580, quando escravos que fugiam de Pernambuco e da Bahia construíram uma pequena vila fortificada, onde eles podiam ser livres e estavam protegidos dos soldados que capturavam e matavam os fugitivos dos engenhos de cana-de-açúcar do litoral. No auge da ocupação, em 1670, o quilombo teria chegado a 30 mil moradores – talvez esse número seja um exagero. Mesmo depois da morte de Ganga-Zumba e de Zumbi, seus dois maiores líderes, os escravos ainda resistiram até o ano de 1710.


Templários e monges da pesada


Saladino era um soberano conhecido por sua serenidade. Mas não durante a guerra. Logo após a Batalha de Hattin, em 1187 (em que os exércitos cristãos da Terra Santa foram massacrados), o soberano da Síria e do Egito tomou uma decisão cruel. Reuniu os 230 cavaleiros templários e hospitalários que foram feitos prisioneiros e ordenou que renegassem a cruz para abraçar o Islã. Quem se recusasse seria decapitado ali mesmo. Se fossem outros os prisioneiros, a proposta talvez fosse aceita pela maioria. Para aquele grupo de fanáticos monges guerreiros, porém, a oferta era uma ofensa. Nenhum deles concordou. Saladino então teria dito: “Vou purificar a terra dessas raças impuras”. Foram todos decapitados.

Pode ter parecido uma solução radical, mas na verdade, para os sarracenos, os templários e as outras ordens de monges guerreiros eram muito temidos. “Ordens militares, como a dos templários, hospitalários e cavaleiros teutões, uniam duas características explosivas: o fanatismo cristão medieval e o tradicional amor às armas da nobreza franca”, explica o professor Wilson Batista, professor do departamento de história da Universidade de São Paulo.


quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Drácula: o filho do dragão


A cena é horripilante, sem dúvida, mas até um cego, incapaz de vê-la, conseguiria sentir a dimensão da atrocidade perpetrada ali. Ou melhor, farejá-la: 20 mil corpos humanos apodrecem ou agonizam diante da cidadela abandonada, uma floresta de empalados capaz de atemorizar até o líder do maior império do planeta. O sultão turco Mehmed II, conquistador de Constantinopla e veterano de muitas guerras, diz para quem quiser ouvir que não é possível enfrentar um inimigo que se dispõe a tal ato. Deixa o comando de seu exército e volta para a segurança de seu harém.


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